Artigo publicado no Diário de Guarapuava de 24 de junho de 2014
“Nesse crescimento e ampliação, na medida em que se torna
necessário avançar objetiva e subjetivamente para proteger o ser humano contra
as agressões antijurídicas, os direitos vão compreendendo cada vez mais objetos
e estendendo-se a cada vez mais sujeitos.” (Sérgio Resende de Barros).
O Direito do Consumidor é mal compreendido por parecer
uma proteção unilateral, ou seja, só para o consumidor. Para superar essa visão
é necessário encontrar o ponto central da criação desses direitos, para
perceber finalmente que se trata de direito bilateral.
O núcleo do Direito do Consumidor está justamente nos
Direitos Humanos, portanto, mais do que proteger uma certa parcela da
população, está fundado em ideal muito mais amplo qual seja, proteger a pessoa
humana.
Historicamente os Direitos Humanos surgiram como freio ao
poder do Estado Absolutista, para o Estado também deveriam existir normas
(direitos e deveres), protegendo o homem dos mandos e desmandos dos monarcas.
Esse momento é chamado de 1ª geração de
Direitos Humanos.
Com o Estado mais “domesticado” e com a ascensão da
burguesia, tem início o crescimento das indústrias e com elas o aumento das jornadas
de trabalho, a diminuição da qualidade de vida, a exploração como meio de
ampliar o lucro. O panorama da época foi uma grandiosa desigualdade social e o
nascer de um monstro descontrolado, o Capitalismo Moderno.
Diante da miséria absoluta de uns para o enriquecimento
de outros, o Papa Leão XIII escreve a encíclica Rerum Novarum (Das coisas novas), onde trata do tema
questão social.
A questão social é uma nova forma de analisar a igualdade,
ela apresenta o tema em duas dimensões, uma formal (igualdade perante a lei) e
outra material (igualdade de fato, de condições de vida).
Como tentativa de segurar o capitalismo brutal surgem
movimentos socialistas (meio), com intuito de formar um Estado Comunista (fim).
Estes Estados sociais (principalmente Alemanha e Rússia) acabam por transformar
o socialismo em totalitarismo, e assim, mesmo que sem querer, acabam por
demonstrar que ainda que o capitalismo seja vil, reserva ao cidadão mais
liberdade que os mandos e desmandos dos déspotas. O capitalismo acaba encontrando
um terreno ainda mais fértil de exploração.
Ainda que o Socialismo tenha se mostrado falho, a ideia
de um Estado Social (questão social) permanece e inaugura a 2ª geração de Direitos Humanos, reconhecendo que não somos iguais em
condições de vida, devendo ser despendido tratamento diverso e preferencial para
os hipossuficientes, a fim de possibilitar que se igualem aos demais.
Rui Barbosa foi um dos primeiros autores brasileiros a
trabalhar com direitos econômicos
sociais e culturais, citando a igualdade material e os hipossuficientes.
Nesse mesmo caminho surge a 3ª geração de Direitos Humanos, funcionando como uma ampliação da
2ª geração. Enquanto a segunda se destina a certas categorias (categorial), a
3ª é difusa, pois visa atingir a coletividade (número indeterminado de seres
humanos).
O Direito do Consumidor é tanto de 2ª como de 3ª geração
de Direitos Humanos, pois ao mesmo tempo que busca “igualar a balança” da
relação de consumo (entendendo o consumidor como categoria hipossuficiente),
também se destina a qualificar estas relações, atingindo a todos os seres
humanos.
Um exemplo da importância e atualidade dessa matéria, bem
como da sua bilateralidade, é o Direito
de Arrependimento.
O direito de arrependimento é pouquíssimo conhecido,
quase não utilizado, apesar de ser muito caro às nossas relações de compra e
venda atuais.
Hoje é possível comprar praticamente tudo pela internet,
desde livros, roupas, até combustível. O telefone também se tornou uma forma de
vender e comprar produtos, diariamente somos tentados a comprar aquele
eletrodoméstico de última geração que acabará com os problemas de casa, mas
temos que ser um dos 100 primeiros, caso contrário não ganharemos o super
brinde!
Mas e se o produto vier
com defeito? E se o produto que chegar não for exatamente o que a propaganda
mostrava? E se as dimensões que estavam no site estiverem erradas e não servir
no espaço planejado? E se eu não gostar?
Para solucionar a maioria desses “E SE”, o CDC traz em
seu artigo 49 a seguinte redação: “Art. 49. O consumidor pode
desistir do contrato, no prazo de 7 dias a contar de sua assinatura ou do ato
de recebimento do produto ou serviço, sempre que a contratação de fornecimento
de produtos e serviços ocorrer fora do estabelecimento comercial, especialmente
por telefone ou a domicílio”.
Isso é o Direito de Arrependimento. Segundo essa
possibilidade, o consumidor tem direito de não aceitar, dentro de 07 dias, o
produto que recebeu. Não precisa ficar demonstrado defeito, falha, vício, o
produto pode estar em perfeitas condições, mas simplesmente não se adequar
àquilo que o consumidor esperava.
Um dos requisitos básicos para que o consumidor possa se
valer desse “benefício” é que o produto tenha, obrigatoriamente, sido adquirido
fora da loja física, isso porque na
loja terá acesso ao produto, podendo fazer juízo de valor pela análise. Análise
mal feita é culpa do consumidor e não do estabelecimento comercial.
É de suma importância que o consumidor saiba que uma vez
arrependido, é dever do vendedor receber o produto, bem como reembolsar o
consumidor de tudo que foi gasto com frete e demais despesas adicionais.
A bilateralidade do direito é observada tanto para o
consumidor, que tem uma ferramenta de segurança a seu dispor, como para o
comerciante, que fica ciente dos riscos da venda nas lojas virtuais, bem como
dos bônus nas transações na loja física (impossibilidade de arrependimento).
Sempre que qualquer problema ou dúvida surgir, o
consumidor e também os comerciantes e empresários têm um órgão específico para
lhes socorrer, que é o PROCON. Aqui em Guarapuava ele fica Rua Saldanha
Marinho, 2837 - Bairro dos Estados; Fone (42) 3621-4590.
Envie suas sugestões à coluna Vida Real Legal pelo email:
vidareallegal@hotmail.com.
Rudy Heitor Rosas
Professor de Direito na Faculdade Campo Real
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